Fui um Padre

Jean Lucien Vinet (1949)

Capítulo VI — As Torturas Mentais da Confissão

Uma prescrição estranha do catolicismo romano que confunde não apenas os protestantes mas também os próprios católicos, é a necessidade de fazer a confissão auricular a um sacerdote a fim de se obter o perdão dos pecados e a salvação eterna. Devemos dizer imediatamente que a confissão, como praticada na Igreja Romana hoje, não foi instituída por Cristo nem era praticada pelos cristãos primitivos. A confissão auricular veio à existência muitos séculos depois de Cristo e é, portanto, uma invenção de Roma.

A razão real por trás dessa prescrição da confissão obrigatória dos pecados é manter todos os católicos romanos submissos e debaixo da autoridade constante de um sacerdote de Roma. A confissão, devemos admitir, fez maravilhas nesse sentido. Se um partido político em nosso país pudesse estabelecer a confissão obrigatória de todos os seus membros, o líder teria um conhecimento completo de suas mais secretas atividades e poderia exercer uma das mais efetivas autoridade sobre todos eles. O partido poderia tornar-se o mais poderoso e mais unido no país e chegaria ao poder facilmente.

A confissão, na Igreja de Roma, mantém os indivíduos sob controle e seus líderes podem exercer uma autoridade mais efetiva sobre os penitentes. Essa é realmente uma das invenções mais inteligentes do catolicismo. É possível que ninguém possa compreender essa declaração completamente, a menos que, como o autor, tenha ele mesmo passado anos operando esse sistema de confissão.

A fim de prover os padres com essa influência incomparável sobre as pessoas por meio da confissão, os pobres católicos romanos eles mesmos têm de pagar caro por essa grande invenção. Realmente eles pagam caro pela desumana e dolorosa tortura mental. Isso nos traz ao próprio assunto deste capítulo. Freqüentemente, ouvimos os pregadores em conferências de avivamento ou em missões na Igreja Romana contarem a seguinte história, a fim de convencê-los da necessidade de contar todos os seus pecados ao padre em confissão, sem omitir um único detalhe.

"Era uma vez uma senhora católica romana que estava morrendo. Exteriormente, essa boa mulher tinha sido uma devota católica e tinha observado todas as prescrições da igreja. Ela era reconhecida por ter participado freqüentemente dos sacramentos da Confissão e da Santa Comunhão. Um sacerdote estava perto dela e tinha acabado de administrar o sacramento da Extrema Unção. Antes de morrer, entretanto, ela conseguiu juntar forças e coragem o bastante para sussurrar esta admissão terrível ao seu confessor: 'Estou condenada... estou condenada... Ocultei um pecado em confissão desde minha juventude e nunca tive coragem de declarar isso. Passei minha vida inteira em pecado e sacrilégio e em desgraça com Deus por causa de meu erro em esconder um pecado do sacerdote.' O pregador acrescentou que a boa mulher finalmente confessou todos os seus pecados e dessa forma morreu em paz com o Criador."

Essa história, que é contada para enfatizar aos católicos romanos a importância de confessar todos os seus pecados ao sacerdote, ilustra bem a tortura mental e as distorções de consciência trazidas à tona em uma alma pelo espectro das confissões auriculares compulsórias de pecados a um sacerdote, especialmente pelas mulheres e moças jovens. Podemos imaginar um Salvador misericordioso, que perdoou pecados por meio de seu amor e seu sangue derramado na cruz, exigindo agora que devamos confessar nossos pecados a um homem pecador a fim de sermos perdoados? Podemos imaginar que Cristo estava preparado para condenar a boa mulher da história acima porque ela deixou de narrar para um sacerdote romano algumas circunstâncias dos erros de sua juventude? Seria blasfêmia acreditar assim. Apenas uma coisa salvou a boa mulher e isso foi a misericórdia e o sangue de seu Salvador, Jesus Cristo, e certamente não sua confissão final a um homem.

A confissão auricular a um sacerdote é, portanto, uma pura invenção do catolicismo. Ela foi instituida, nós sacerdotes sabemos muito bem, primeiramente para tornar possível aos agentes de Roma controlarem as mais íntimas reações dos corações e das mentes humanas nos interesses da autoridade e do prestígio de um sistema político e religioso. Por meio da confissão, Roma não apenas controla os governos, as juntas escolares, etc., quando os membros católicos romanos se ajoelham aos pés do sacerdote no confessionário e recebem instruções que determinarão suas decisões e ações.

Os católicos romanos são realmente enganados pelos sacerdotes romanos que ensinam que Cristo instituiu a confissão quando disse: "Àqueles a quem perdoardes os pecados lhes são perdoados; e àqueles a quem os retiverdes lhes são retidos." [João 20:23] Mesmo que os sacerdotes tivessem o poder divino para remir pecados, isso ainda não significaria que a confissão auricular real desses pecados a um sacerdote é um requisito divino. Se um filho ofendeu seu pai e foi perambular em uma terra distante, o perdão paternal é verdadeiro, podia ser estendido para esse filho por meio de um representante, se o pai assim desejar fazer, mas isso não significa que os pecados e erros do jovem tem de ser narrados com todos os seus detalhes ao representante do pai para que ele receba o perdão paterno. Que os sacerdotes de Roma, que alegam serem os representantes do Senhor misericordioso, falem aos pecadores sobre as misericórdias de Cristo, mas não os submetam às torturas mentais do catolicismo.

Antes de estudarmos o confessionário e as torturas mentais que impõe nas mentes e nas almas, especialmente das mulheres penitentes, devemos expor a doutrina romana que determina o que dizer na confissão e como dizer.

Um católico romano, diz sua Igreja, deve, para obter paz com Deus, declarar todas suas ações pecaminosas, omissões e seus mais secretos pensamentos e desejos, especificando minuciosamente os tipos de pecados cometidos, o número de vezes e todas as circunstâncias que possam alterar a gravidade do pecado. Um assassino é forçado a declarar seus crimes, uma moça seus mais íntimos pensamentos e desejos e uma criança os mínimas travessuras de sua inocente vida. Os teólogos romanos esboçaram uma longa lista de pecados para serem confessados e muitos desses pecados são realmente desconhecidos de muitos católicos romanos. Eles dividiram os pecados em várias classes tais como "originais", "reais", "capitais", "veniais", "mortais", etc.

Já vi homens tremerem, mulheres desmaiarem e crianças chorarem quando chega a hora de confessar seus pecados. Um sacerdote não pode ouvir as confissões por muitos meses antes que compreenda que esse procedimento não poderia ter sido instituído pelo terno e misericordioso Senhor. Por outro lado, já vi padres rirem e brincarem ao se referirem ao contrangimento de seus penitentes. Se podemos dizer que a missa é uma fraude de ordem financeira, é também verdadeiro que a confissão é uma impostura de autoridade pois os padres investigam as mentes e as almas de outros seres humanos. Quando uma organização tal como o sistema romano pode controlar não apenas a educação, a família e políticas do governo civil de seus membros, mas mesmo seus próprios pensamentos e desejos, não nos admiramos que isso possa prosperar e ser bem-sucedido. Os católicos romanos, admitam eles ou não, são forçados à submissão ao Romanismo por meio do processo de tortura da confissão auricular. Analisemos as confissões de uma criança, de uma moça e a de uma mulher casada.

(a) Confissão de uma Criança

Esta criança poderia ter apenas sete anos de idade. Ela foi instruída a contar todos os seus pecados ao sacerdote. Se não fizer isso, cometerá um sacrilégio e, se morrer, não irá para o Paraíso. O menino está naturalmente muito confuso sobre o que realmente constitui pecado. Ele crê que muitas de suas ações são pecados sérios. Algumas crianças pensam que algumas necessidades fisiológicas são pecados graves a serem confessados. Entretanto, a criança é naturalmente tímida e relutante para contar o que tem feito ou pensado. O resultado é que ela omite declarar certas coisas que não são realmente pecaminosas mas que pensa que são. Sua consciência a censurará por ter ocultado um pecado em confissão e ela experimentará crises de consciência e provavelmente terminará em acreditar que não pode obter paz com Deus. A confissão arruinou a alma dessa criança. Ela foi enganada e mais um católico romano começa uma vida de tortura mental e uma falsa concepção acerca da misericórdia de Cristo. O catolicismo com seu sistema da confissão não pode muito bem ser identificado com a ternura do Senhor que disse: "Deixai os meninos, e não os estorveis de vir a mim; porque dos tais é o reino dos céus." [Mateus 19:14].

(b) Confissão de uma Mulher Jovem

Temos agora uma tímida jovem católica romana, passando pelo estágio da infância para a puberdade, que está para entrar no confessionário. Ela está naturalmente embaraçada e seu estado mental é exatamente o que um sórdido confessor deseja explorar. O sacerdote agora ouvirá de uma mulher jovem os mais secretos pensamentos e os desejos de sua alma. Sua mente e sua alma são crucificados no altar do romanismo e de seu curiosos e pecaminosos sacerdotes.

Se a jovem estiver relutante para falar, o confessor fará as seguintes perguntas:

  1. "Foi com um homem? Ele era casado? Era parente seu? Era um padre?"

  2. Você deu pleno consentimento de sua vontade para esses pensamentos, desejos, etc? Foi uma ação completa? Foi contra alguma das leis de natureza? Quantas vezes você consentiu com esses pensamentos, desejos, ações, etc?"

Muitas outras perguntas constrangedoras são feitas de acordo com os pecados acusados. Muitas dessas perguntas são deixadas a critério ou falta de critério do confessor. Algumas vezes, as perguntas feitas são estúpidas e criminosas. Conheço um jovem pastor de uma Catedral de Manitoba, que se considerava um especialista em confissões de mulheres jovens, que perguntava às suas jovens penitentes se usavam calcinhas ou alguma outra variedade de roupa de baixo feminina. Esses vexatórios detalhes de uma confissão são mencionados aqui para ilustrar que se quer dizer com as torturas da confissão. Os católicos romanos sabem muito bem que estou revelando a pura verdade.

Somos conhecedores da prática de certos padres anormais no confessionário. Investigamos alguns casos em que o confessor aprende a respeito das fraquezas de uma possível vítima no confessionário. Essa vítima torna-se uma presa fácil para as paixões e vícios desses padres.

A prática de persuadir as mulheres penitentes a pecarem no confessionário é, de fato, tão comum, que os teólogos romanos inseriram em seus manuais de teologia uma longa tese que disciplina a conduta a ser seguida por sacerdotes e penitentes que pecaram dessa maneira. O nome em latim é: "De solicitatione in confessionali."

O confessionário, longe de ser um lugar de perdão de pecados, é muito freqüentemente a cena dos mais abomináveis crimes sexuais.

(c) Confissão de uma Mulher Casada

Uma mulher casada entra no confessionário. Ela contará a um homem estranho segredos que provavelmente não ousaria revelar para seu próprio marido. Ela é até mesmo obrigada a revelar certos segredos de seu marido. Isso acontece especialmente quando um pecado é cometido com o consenso tanto do marido quanto da mulher. Na Igreja Romana, todas as variedades de controle da natalidade são pecado e devem ser confessadas com todas suas circunstâncias. O marido pode ser de fé protestante e sua mulher católica romana terá de revelar ao sacerdote as mais íntimas relações de sua vida conjugal. O sacerdote saberá mais sobre a mulher que o marido. Não há mais segredos de família porque Roma requer que os corações e almas sejam completamente explorados pelos padres. Dessa maneira, o romanismo controla toda a vida íntima dos casais.

Uma mulher casada que seja naturalmente discreta e honesta entrará no confessionário com apreensão e, freqüentemente, com desespero. Ela teme aquele questionamento terrível e infalível. É impossível descrever a inconveniência mental que ela agora experimenta pelo espectro da confissão compulsória. Uma mulher casada que não tinha muito a confessar, me disse um dia que essa obrigação de contar tudo ao sacerdote era "diabólica" e naquela hora não pude admitir que ela estava absolutamente correta.

O questionário no caso de uma mulher casada é mais ou menos assim:

"Quantas vezes você desempenha seus deveres conjugais?"

"Você se recusa a desempenhá-los às vezes? Por quê?"

"Quantas vezes?"

"Suas ações conjugais são completas?"

"A gravidez poderia ocorrer?"

"Você usa anticoncepcionais?"

"Quantas vezes?"

"Algum pensamento, desejo, ou ações com outros homens que não seu marido, etc, etc?"

Pobres mulheres católicas romanas! Sabemos tão bem que suas ternas almas são torturadas à morte por essa terrível obrigação de contar, não apenas seus pecados, mas também os mais íntimos segredos de sua vida conjugal. É claro que você é livre para praticar as prescrições de sua igreja. Como um ex-padre, nunca iria sugerir que você seja infiel às suas convicções, mas como ex-sacerdote também posso lhe dizer que essa tortura mental impostas sobre sua alma não é uma prescrição do Salvador para a obtenção do perdão dos pecados, mas são puras invenções de homens para manter suas mentes e seus corações sob o controle de um sistema, a torturadora organização religiosa romana.

Os segredos que você confidenciou para mim serão para sempre guardados e nunca serão divulgados, não é preciso ter medo disso. Os ex-padres que tiveram a coragem de sacudir as correntes de Roma são naturalmente honestos demais para divulgar os segredos que lhes foram confiados. No entanto, devo admitir que como sacerdote eu não tinha nenhum poder para perdoar seus pecados.

Nenhum sacerdote tem tal poder. Cristo é o ÚNICO Mediador entre Deus e os homens. Só ele pode dar graça e salvação. Essa não é minha opinião somente, mas é o ensino do próprio Cristo. "Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim." [João 14:6].

Se meu caro amigo católico romano abrir o evangelho em Lucas, capítulo 5, verso 21, lerá isto:

"Quem pode perdoar pecados, senão só Deus?"

Que estranho que Lucas não disse que os sacerdotes católicos romanos podem perdoar pecados por meio da tortura mental da confissão auricular.

(págs. 59-67)


Tradução: Walter Nunes Braz Jr.
Data da publicação: 6/8/2002
A Espada do Espírito: http://www.espada.eti.br/fuipadre.htm